22 abril 2006

A praia, a lua e a amante vestida de luz


Erro meu de te pensar ainda por cá quando já estavas por terras de Vera Cruz. Não faz mal e é bom saber-te de novo por cá.


Presenteias-me com cheiros, calor e histórias como só tu sabes contar. Gosto dos teus quadros porque me fazes sentir lá, dentro deles; sabes, consigo até ouvir as vozes, os contos e os cantos e sinto-me a rodopiar, eu que sempre fui péssimo dançarino, nessas danças de palavras e alegria. Sabes, depois, talvez cansado de dançar ou talvez atingido pela vergonha da inexperiência, sento-me no areal ao som desse mar de paz e deixo-me inundar pela noite e pela acalmia mágica da lua, senhora minha; então adormeço e sonho o meu tempo de criança quando era inocente e não me tentava turtuosamente enganar, não havia ilusões, o tempo era infindável e tudo era possível, até ser feliz. Obrigado do fundo do coração, minha amiga, por me fazeres lembrar, nem que seja por momentos, de saber um dia ter sido feliz.

Paris é talvez diferente, com outras paisagens construídas, outras gentes e palavras quotidianas escritas de outro modo. Vou-te confessar um segredo: Paris seduz-me só pela pronúncia do nome; é uma amante fogosa desde que me recordo de a conhecer, enfeitiça-me na sua sonoridade peculiar, uma voz de corista de cabaret, e inebria-me envolvendo-me em perfumes que só a ela lhe conheço. Quando a encontro sabe sempre como me seduzir. Quando parto não sinto que sou eu a abandoná-la no quarto mas que acordo com o lugar vazio ao meu lado e uma carta sobre a mesinha de cabeceira em que ela escrevinhou apressadamente logo após se vestir e antes de fechar silenciosamente a porta: - até à próxima.
No íntimo sinto sempre que haverá uma próxima vez até que um dia ela queira ficar.


Devo dizer-te que as histórias, nas tuas palavras, me soam geralmente como quadros (já o referi acima); tento vê-los como fotografias (caio sempre nessa tentação quando leio uma história, possivelmente devido à minha paixão pela fotografia) mas não as consigo enquadrar entre a abertura e fecho do obturador, sinto sempre o cheiro sempre das tintas e as cores misturadas nas palavras; é um modo muito pessoal de ler as histórias mas gosto de as sentir assim. Há todavia uma história tua que se desenquadra do que acabei de dizer e que gosto de reler de quando em vez pelo belíssimo instantâneo que conseguiste: passageiros.
Gostava de te lançar um dia um desafio que consistiria no inverso: saber a história que encontrarias numa fotografia e as palavras que a construiriam; gostaria muito de ver o resultado. Depois deixa-me saber a tua opinião.


E à parte de tudo isto como te sentes de volta à labuta? Custa, eu sei, mas saberá sempre bem, por certo, saborear de novo os entardeceres do Tejo, os sons e os cheiros desta cidade que um dia, de um modo diferente de Paris, aprendi a amar.


Bem vinda!
Beijos.


1 Comments:

Blogger maresia said...

ai, o mar, a luz, o calor do corpo do outro

08:56  

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